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Saneamento, direito fundamental


por Mauro Scarpinatti*


A importância do saneamento ganhou força nas últimas décadas, e a Organização das Nações Unidas (ONU) passou a reconhecê-lo como direito humano básico desde 2010. No Brasil, apesar de ser reconhecido indiretamente como direito no capítulo que trata de Meio Ambiente na Constituição, um Projeto de Emenda Constitucional (PEC 07) foi apresentado, também em 2010, para explicitá-lo entre os direitos fundamentais, o que, porém, foi arquivado em 2014.


Assim como outros direitos fundamentais, o saneamento está longe de atender a todos os brasileiros, nada menos que 51,4% da população, mais de 100 milhões de pessoas, não contam com rede de esgoto, e 35 milhões não têm acesso à água tratada, conforme dados do Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento (SNIS). As desigualdades regionais tornam o problema ainda mais agudo, no Sudeste 91,7% da população possui água tratada, já no Nordeste somente 54,51% possui essa cobertura.


Outro grande problema é que 60% do esgoto coletado não recebe nenhum tratamento e é despejado diretamente nos rios, segundo dados do Ministério das Cidades. Os casos mais conhecidos são os dos rios Tietê, Pinheiros e Tamanduateí, em São Paulo, e da Baía da Guanabara, no Rio de Janeiro, que assustou os velejadores nas Olimpíadas do Rio de Janeiro.


Os investimentos em saneamento no Brasil aumentaram nos últimos anos, porém estão longe de serem suficientes, especialmente nas áreas urbanas onde vive cerca de 85% da população do país, isso evidentemente compromete o meio ambiente e a qualidade de vida das pessoas.


Enchentes, lixo, degradação ambiental, contaminação dos mananciais, água sem tratamento, ausência de tratamento de esgotos, possuem um vínculo direto com doenças que são transmitidas por água contaminada com esgotos humanos, dejetos, animais e detritos. Moléstias como diarreias, dengue, febre tifoide, malária, Zika, febre chikungunya, entre outras, causam milhares de internações e mortes todos os anos. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) indicam que mais de 400 mil pessoas no país foram internadas por causa de diarreia em 2013, as principais vítimas são as crianças com idade entre 0 e 5 anos, e a falta de saneamento é a grande responsável por esse resultado.


O médico Drauzio Varella, no artigo “Inteligência e Indigência” publicado em 2013, afirma que: “Quadros diarreicos de repetição, durante os primeiros cinco anos de vida, podem privar o cérebro das calorias necessárias para o desenvolvimento pleno e comprometer para sempre o quociente intelectual


Segundo dados publicados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), para cada R$ 1 investido em saneamento (tratamento de água e esgoto), R$ 4 são economizados no tratamento das doenças. Há indicadores que mostram que nas localidades onde há ausência de saneamento, as pessoas faltam mais ao trabalho e têm produtividade menor.


A pesquisa “Relação entre saneamento básico no brasil e saúde da população sob a ótica das internações hospitalares por doenças de veiculação hídrica”, feita pela Universidade Federal de Pelotas, no Rio Grande do Sul, e publicada em março de 2016, aponta que, quando se aumenta em 1% o número de domicílios conectados à rede de esgoto, há uma redução de 1,74% na taxa de internações hospitalares.


O tratamento do esgoto está entre as medidas mais importantes para melhorar o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Tanto que os países membros da ONU se comprometeram a reduzir pela metade o número de pessoas sem acesso às redes coletoras até 2015. É o item 7º dos compromissos dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (conjunto de metas socioeconômicas assumidas pelos governos de 191 países para tornar o mundo mais justo e solidário).


Um dado positivo, e muito importante, é que apesar do lento avanço dos sistemas de saneamento no Brasil, os resultados são expressivos no campo da saúde. Conforme Indicadores de Desenvolvimento Sustentável (IDS), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE-2015), no período 2003-2013, o país reduziu em 44% as internações hospitalares provocadas por doenças relacionadas ao saneamento inadequado. A gerente de estudos ambientais do IBGE, Denise Kronemberg, afirma que "a queda vem ocorrendo devido ao maior acesso da população ao saneamento básico. Há melhoria das habitações, higiene, abastecimento de água, esgotamento sanitário e até de coleta de lixo", enumerou a pesquisadora. Mesmo com o avanço, 16% dos brasileiros residentes em áreas urbanas não possuíam acesso a sistemas de saneamento básico. Nas áreas rurais, a taxa é de 36%.

* Mauro Scarpinatti, ambientalista, é economista, mestre em história social e professor

Universitário.

Fontes consultadas:

Drauzio Varella. “Inteligência e indigência”. Drauzio Varella, 26 set. 2013. Disponível em: <http://drauziovarella.com.br/drauzio/inteligencia-e-indigencia/>.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Indicadores de Desenvolvimento Sustentável, 2015. Disponível em: <www.ibge.gov.br/home/geociencias/recursosnaturais/ids/default_2015.shtm>.

Robson Sales. Valor Econômico, 19 jun. 2015. “Melhora no saneamento reduz em 44% internações hospitalares em 10 anos”. Disponível em: <www.valor.com.br//brasil/4101172/melhora-no-saneamento-reduz-em-44-internacoes-hospitalares-em-10-anos>.

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